domingo, 28 de setembro de 2008

CAPÍTULO V - REENCONTRO & BODAS

O dia tão esperado chega e Vitor, aos seus 21 anos, completamente dono de si, chegava ao Brasil. Realizada a vontade do pai, agora era a sua vez de decidir seu futuro. Desde o dia de seu aniversário determinou a sua volta e agora ela se concretizava.
Marisa resolveu cuidar dos preparativos para a volta do filho e deixou o momento do reencontro primeiramente para Helena. A jovem se fazia notar cada vez mais por sua beleza. Seus lindos cabelos loiros, agora pouco acima dos ombros, emolduravam suas delicadas feições dos seus 19 anos. Esperando o amado com ansiedade, Helena olhava o relógio. De repente, lá está ele, com seu traje esporte, segurando o casaco devido a diferença de temperatura, naquele 29 de janeiro de 1973. Os braços da amada se abrem e esta vai correndo ao seu encontro:
- Vitor!
- Lelê!
Os dois abraçam-se e beijam-se, selando aquele amor que o tempo e a distância nunca puderam apagar.
- Que saudade! – exclama Vitor, ainda apertando-a em seus braços.
- Quase cinco anos, pareceu uma eternidade.
- Desde que cheguei já contava os dias, mal podia esperar a hora de ter você em meus braços. – olhando em volta, Vitor dá conta de que a mãe e os irmãos não estão. – Cadê minha mãe, meus irmãos?
- Eles concederam este primeiro momento para nós. Sabe como sua mãe é caprichosa, quer que você veja tudo em ordem.
- Eu soube que o Otávio e o Olavo também tiveram que sair do Brasil. Entraram “de cabeça” no movimento da Luta Armada.
- É...
- Mas eles também ainda voltam!
- Ah, Vitor, que doce ilusão a sua! Este país não vai mudar com tanta rapidez, nem com facilidade.
- Enquanto há vida, há esperança, amor.
- Vitor, eu sou filha de militar e sei das coisas. Meu pai é muito justo e é contrário a tudo isto. Ele conhece muito bem o meio em que lida. Sabe o que disse quando começou tudo isto?
- O que?
- “Se você quer conhecer alguém, dê poder a ele”. Estes “milicos” se sentem os donos do país, eles usam e abusam deste poder. Mas eu fico revoltada não é só com eles, a “esquerda”, também está errada.
- Mas em que você acha que estão errados?
- Vitor, eles já seqüestraram um Embaixador...
- Pra soltar presos políticos.
- Está bem informado, hein?
- O Otávio e o Olavo escreveram contando.
- Mas não foi só isto. Este Embaixador tem mulher, ela sofreu muito. Assim como eu sofri por causa de uma lista que encabeçaram para matar militares, entre eles o meu pai que não tem nada com isto tudo.
- É?!
- Como você vê, existem os dois lados da moeda. Ninguém é tão bom, como não é tão mau.
- Ah, mas vamos deixar isto pra lá! Estou ansioso pra chegar em casa, não sem antes participar uma coisa a você.
- O que?
- Eu vou casar com você.
- Hein?
- Isto mesmo que você ouviu.
- Mas, Vitor...
- Não aceito não como resposta.
- Não é isto, Vitor...Você já tem perspectiva de emprego?
- Claro! Vou trabalhar na subsidiária da firma do meu pai.
- Por que não vai pra firma principal?
- Ah, Lelê, na outra firma vou ter mais liberdade.
- Olha lá Vitor...
- Uai! Qual é o problema?
- Vitor, em primeiro lugar, você não é mineiro, não sabe como me irrita este seu “uai!”; em segundo lugar, se houver algum problema e alguma das firmas tiver que ser negociada, fatalmente será a outra, porque não é matriz.
- Ah, Lelê, que derrotismo!
- Não é isto, Vitor. A vida é assim.
- Vamos pensar nisto depois, não estraga a festa.
Os dois seguem para Ipanema e Helena pede a Vitor que espere antes de ir para sua casa, com uma desculpa que precisa passar pela sua antes. Rapidamente, liga para Marisa e avisa que Vitor está chegando. Logo a seguir, vão para a casa de Vitor e este é recebido com uma festa, bandeirinhas, cartazes, um com os dizeres: “O BOM FILHO À CASA TORNA!” Em meio à festa, Vitor que já pegara Helena de surpresa, resolve fazer o mesmo com seus pais:

- Pessoal! Um momento de atenção.
- Ai, meu Deus... – sussurra Helena, prevendo a intenção de Vitor.
- Coronel, Dona Marta; é com o coração cheio de alegria que eu quero aproveitar a oportunidade para pedir a mão de Lelê em casamento!
O Coronel e sua esposa ficaram um tanto desconcertados, porém, pelo grande apreço aos Castelli procuraram não dar a perceber sua preocupação. Refeito do susto, o Coronel ponderou:
- Bem Vitor...Vocês são muito jovens, casamento é um passo muito sério...
- Exatamente. Por isto mesmo, já tenho uma carta de apresentação por parte do meu primo Marco Antônio para trabalhar na empresa que é subsidiária da que o meu pai deixou.
- Nós hoje estamos em festa, vamos acertar estes detalhes depois, não é querido? – contemporizou Dona Marta.
Chegando em casa, o Coronel pede um apoio à esposa:
- Marta, o que vamos fazer?
- Eles se gostam. Você esquece que o meu pai também não era muito a favor do nosso casamento porque você teria que viajar muito? Ele tinha medo até que pudesse estourar uma outra guerra e eu ficasse viúva! – lembra rindo
- Mas Marta... É diferente!
- Qual a diferença meu querido, se nós realizamos nosso sonho? Por que é diferente com eles? Não são jovens? Não tem sonhos como um dia nós também tivemos? Por que impedir a felicidade deles?
- Mas...Ele é um agitador!
- Ele já está mais maduro, viveu quase cinco anos em outro país. Está com outro pensamento. Se ainda quisesse se meter em confusões, não acredito que teria pedido a Lelê em casamento.
- Ai...Deus queira que você esteja certa.
- Tão certa como que te amo. Se impedirmos este sonho, ele vai virar pesadelo. Você se esquece daquela menina que vivia lá onde eu nasci que fugiu pra casar?
- Nem me fale.
- Meu querido Marsílio ouça sua esposa. Você parece que não conhece a filha que tem. Você a ama muito, não acredito que queira vê-la infeliz.
- É... Jamais gostaria de vê-la infeliz, mas não nego que vai ser difícil entregá-la a um rapaz com este temperamento. Confesso que faria mais gosto no casamento da Lolô com o Paulo.
- Se ela der uma chance a ele.
- Pra mim ela gosta dele, mas está se fazendo de difícil.
- É outro temperamento, meu bem.
- Pelo menos a Lili, não pensa nisto agora.
- Ela quer terminar os estudos, mas depois vai encontrar alguém.
- Como é preocupante ser pai de moças!
- Eu estou muito satisfeita. Amo demais minhas três filhas. Foram três presentes de Deus.
Na cozinha, Helena conversava com Elisa:
- Elisa, ele quer casar de qualquer jeito. Disse até que vai dar entrada num apartamento com o dinheiro que economizou na Itália.
- Então ele veio decidido.
Neste momento, o Coronel passa perto e brinca:
- Ah... “A conversa chegou na cozinha!”
- Ué...O senhor é que veio aqui, Coronel. Seu radar está ligado, hein?
- Está mesmo. Lelê, apesar de minhas preocupações, quero ver você feliz. Minha benção e a de sua mãe estão concedidas.
- Papai...Obrigada... – Helena chora abraçando o pai.
E assim, dois meses depois se realizava o casamento, com tudo o que uma filha de militar tem direito, inclusive recepção no Clube Militar. Sendo Marisa uma pessoa extremamente atenta às questões financeiras, não achava justo que só os Carajás financiassem o casamento e depois de incessante insistência, foi aceita a sua participação como patrocinadora do evento.
Tudo parecia bem, exceto por uma coisa: Vitor excedeu-se no champanhe. Embora Marisa fosse contra a bebida e não a houvesse financiado, os pais de Helena estavam acostumados com o uso de bebidas nas festas. Vitor até precisou ser ajudado para ir para o Hotel, pois não tinha condições de dirigir. Chegando lá, Helena pergunta:
- Amor, você está bem?
- Estou ótimo, minha querida, eu te amo.
- Também te amo, amor. Você abusou do champanhe, hein?
- Ah, Lelê, não é sempre que a gente pode tomar champanhe. Eu quis comemorar o dia mais feliz da minha vida!
- Mas “manera”, amor.
- Hoje não é dia de “manerar”. Eu vou embriagar você de amor.
Mesmo bêbado Vitor não perderia o romantismo. O consolo de Helena foi a intensa noite de núpcias. Os dois viviam o frescor da juventude, quando tudo é sonho, poesia.

CAPÍTULO VI
A CHEGADA DA PRIMOGÊNITA
Aos dois meses de casados, Vitor e Helena estavam felizes e os problemas do dia a dia eram como o de todo o casal normal. Tudo corria bem. Tinham uma vida em comum saudável e a próxima benção logo viria num dia que Helena fôra ao médico buscar o resultado de um exame e exultante iria participar ao marido em seu trabalho:
- Vitor!
- Você por aqui? Que grata surpresa, amor!
- É que eu tinha que contar uma grande notícia pra você – Os olhares de cumplicidade se comunicavam e Vitor logo prevê:
- É o que eu estou pensando?
- Estou grávida, amor! – Vitor não se controla e anuncia:
- Vou ser pai!
- Amor, fala mais baixo!
- Eu quero que o mundo saiba que eu vou ser pai! Vamos comemorar! Na saída do trabalho vamos jantar fora!
Durante o jantar os dois fazem planos.
- Vai ser uma menina. – afirmou Vitor -Chega de tanto homem na “Dinastia dos Castelli”. Qual poderá ser o nome?
- A dinda sugeriu que se eu tivesse um dia uma menina, desse o nome Roberta.
- Pelo menos em alguma coisa nós concordamos.
- Ah, Vitor...Ainda esta implicância com ela?
- Ela é que não gosta de mim.
- Não é isto, Vitor. É que ela tinha medo quando você era envolvido com aquele pessoal de política.
- E o que ela tem com isto?
- Ela tinha medo por minha causa. Temia que eu viesse a sofrer alguma conseqüência.
- Lelê se for preciso eu ainda ajudarei algum amigo. Assim como pedi pelo Otávio e pelo Olavo. Sinto falta dos meus amigos, mas minha consciência está tranqüila. Você não viria a sofrer nada, eu tenho bons contatos.
- Não vamos falar mais sobre isto, amor.
- Garçom, mais um chope!
- Manera, amor.
- Ah, Lelê, chope não embriaga ninguém.
- Contanto que seja com moderação.
Apesar dos avisos de Helena, para Vitor toda comemoração tinha que ser “regada com alguma bebida”. Naquela noite, por um verdadeiro livramento de Deus, não ocorreu um desastre, pois Vitor dirigia “costurando”, deixando Helena apavorada. Chegando em casa, Helena argumenta:
- Vitor, você abusou outra vez.
- Lelê, eu estou só comemorando!
- Mas você pode comemorar com limites.
- Ah...não vamos discutir.
- Toma um banho e deita, amor.
- Não precisa recomendar nada, eu estou bem grandinho.
- E você não precisa ser agressivo.
- Tá... desculpe.
No dia seguinte, Helena chama Vitor, que como já era de se esperar, estava com uma tremenda ressaca.
- Vitor acorda! Já está em cima da hora!
- Ai...Que dor de cabeça!
- Agora vê se aprende, não abusa.
- Ah, Lelê, já amanhece me dando sermão! Já chega a minha mãe!
- Toma um banho de água fria que cura a ressaca!
- Ah, não enche!
- Que mau humor!
Os meses vão passando e a chegada do 1º herdeiro – que seria herdeira – vai se aproximando. Num fim de tarde de domingo, quando o casal acabara de sair da casa de Marisa e entrara no carro, Helena tranqüilamente informou:
- A bolsa estourou.
- O quê?!
- Calma Vitor, ainda tem doze horas pra nascer.
- Vamos pro hospital.
- Primeiro vamos passar em casa. Eu vou pegar as minhas camisolas, as roupinhas do neném.
- Temos que ser rápidos.
- Calma! Vamos arrumar as coisas e vamos.
O nascimento de Roberta foi tranqüilo. No hospital, estavam presentes o casal Carajás, Heloísa e Marisa.

O coronel entusiasmado comenta:
- Minha neta é a mais bonita do berçário!
- Que dirá a mais feia!
- Ela é linda!
- É horrorosa!
- Mãe desnaturada!
- Gente, ela acabou de nascer de parto normal, ainda não pode ser linda! – observa Heloísa.
As visitas vão ao quarto e Vitor, que estivera comemorando com os amigos, chega.
- Vitor! Vá lavar as mãos! – adverte Heloísa.
- Mas não estão sujas, Lolô! – responde Vitor.
- Como é que não estão, cunhado? Você está vindo da rua! Não quer zelar pela sua filha? Você só põe as mãos na minha afilhada depois de lavá-las. Eu falo em nome do meu curso de enfermagem e do Ministério da Saúde!
- Vai filho, pelo bem da sua filha. – reforça carinhosamente Marisa.
- Está bem, está bem!
- Espera um pouco, mais uma coisa, cunhado.
- O que?
- Escove os dentes também, que este bafo de bebida está chegando até aqui.
- Ai...Tá... – Vitor vai lavar as mãos e escova os dentes. Helena lamenta:
- Gente, pro Vitor toda a comemoração tem que ter alguma bebida.
Quando Vitor volta, Heloísa pede:
- Vitor toma este café.
- Pra quê?
- Você ainda pergunta? Pra você sossegar, “esvaziar a cara!” Faça isto pela sua mulher e pela sua filha!
- Ah! Está bem, está bem! – bebe contrariado.
A alegria de Vitor por ser pai era grande, mas seu vício era maior. Mesmo com as orações e conselhos da mãe, a energia da cunhada e o amor da esposa, não dispensava o chope com a roda de amigos na saída do trabalho.
Num fim de semana, chega eufórico com as faces rubras dando sinal de que já havia bebido. Helena olha para uma sacola cheia de cervejas na mão do marido escrito: “OBRIGADO VASCO!” E pergunta:
- Vitor, o que é isto?
- Ganhei uma aposta que fiz com os amigos, Lelê! O Vasco é campeão! “Vasco da Gama, és o orgulho do Brasil!” – cantarola aos risos.
Edite, que estava vendo Bertinha no quarto ouve e aparece na sala.
- Que está havendo aqui?
- Ah...A senhora está aí? – Vitor decepciona-se com a presença da madrinha da esposa.
- É...Pra sua infelicidade...
- Dinda! Não provoca! – repreende Helena.
- Desculpe minha filha, mas é difícil.
- Difícil o que? A senhora nos sustenta? Paga nossas contas? – desafia Vitor.
- Querida, eu já vou, não quero discutir.
- É bom mesmo, melhor que não volte! – retruca Vitor.
- Ela é minha madrinha, volta aqui quando quiser! – responde Helena.
- Então que seja quando eu não estiver em casa!
- Tchau, Lelê. – despede-se Edite.
- Adeus, dona Edite! – fala Vitor com sarcasmo. Edite vai embora ingnorando – o
- Só vem aqui pra encher! – Vitor continua a reclamar e Elisa que estava ajudando Helena, ouve e procura contemporizar:
- Vitor, o que está acontecendo?
- Aquela “dona”, que vem aqui pra me azucrinar! – Helena faz menção em responder, mas Elisa com um gesto com a mão consegue contê-la.
- Ô, Vitor, ainda esta implicância?
- Que ela tem comigo, né?
- Vitor, eu gosto tanto de vocês, dei a maior força pra se casarem. Você vai se aborrecer por causa da dona Edite? Ela tem este gênio, mas é boa pessoa. Ela se preocupa com a Lelê.
- Mas ninguém pode negar que é implicante. Já a ouvi dizer ao Coronel que eu sou um agitador, um “pau d´água!”
- Vitor, não “dá bola”, ela fala sem pensar. Ela trabalha pro governo, acha o pessoal envolvido com política perigoso, é uma pessoa de outra geração, “Esfria”, amigo. Vai tomar um banho que eu fiz uma comidinha gostosa. Pede desculpa pra Lelê. – Elisa chega perto dele falando baixo.
- Desculpe Lelê.
- Tá desculpado, amor.
- Fico feliz de ver vocês se entenderem. Vitor, como a Bertinha está linda! Os olhos dela vão continuar azuis, quando ela nasceu eram acinzentados. Sua mãe conta que os do seu pai também eram.

- Eram... – Vitor responde com um ar melancólico.
Depois de tudo calmo, Vitor devido à bebida dorme pesadamente e Helena deita-se pouco depois. De madrugada, o telefone toca e Elisa atende cheia de sono.
- Alô?
- É da casa do Vitor? – interroga uma voz embriagada.
- É.
- Ele está?
- Está dormindo.
- Chame.
- Eu não! Já é mais de uma hora da manhã!
- Pode chamar, é o Raul, amigo dele.
- Não vou chamar!
- Olha que a coisa vai ficar feia!
- É?! Pra você! O sogro dele é coronel e vai te pegar!
- O que?
- É isto mesmo! Não ouse ligar pra cá novamente se não quiser ser preso! Ele tem como descobrir seu telefone seu “cachaceiro!” – grita batendo o telefone. Helena acorda e pergunta à Elisa:
- Quem era?
- Ah, um desocupado querendo que eu chamasse o Vitor! Que audácia!
- Eu não agüento mais estes amigos do Vitor! Quando é que isto vai acabar?
Apesar do início de um desânimo em relação ao vício do marido, o amor de Helena por este, ainda era mais forte. Porém, mais barreiras viriam.

2 comentários:

denise beliato disse...

Tá muito bom.

p.s:Não sou mineira mas também falo uai.

as linhas dos meu mundo disse...

Está cada vez melhor..

esse vício!! Só Jesus pra libertar, viu??

[aa]

P.S: Não sou mineira mas também falo "Uai", uai! Morei lá um tempo.. criei o hábito de falar e continuo falando.. axo tão bonitinho!!